delegado valdir barbosa

Por Valdir Barbosa

Muitos anos atrás, já se vão quase trinta, desfiava minhas penas, ao lado de Romero Leal, delegado de scol da polícia pernambucana, como outros tantos de idêntico quilate. Além dos seus conterrâneos, amalgamávamos esforços junto a parceiros sergipanos, paraibanos, cearenses e potiguares, dos quais me permito não citar nomes, posto poderia olvidar algum destes, porém, seus rostos, suas vozes e atitudes estão e estarão sempre guardados na memória deste velho homem de polícia que completou, no dia vinte e três do janeiro fluindo, quarenta e três anos contados, a partir da primeira vez que assumiu as funções de autoridade policial, na longínqua Itapetinga, cidade fincada no sudoeste baiano.

Naquela época, viandantes peregrinos incansáveis, no afã de combater o crime percorríamos ombreados os sertões tórridos deste imenso Brasil, caçadores sem tréguas dos mais diversos tipos de delinquentes, responsáveis por crimes de extorsão mediante sequestro, roubos a bancos, carros-fortes e homicidas sanguinários, assim, a junção destes esforços possibilitou ações exitosas, responsáveis por desbaratar quadrilhas insolentes, atuantes em todo norte e nordeste do país.

Entretanto, minhas visitas, mesmo laborais, a terra cuja capital guarda pontes fincadas sobre os Rios Capibaribe e Beberibe, canto do frevo e de homens cuja têmpera é forjada pelo mais inoxidável aço guardava em meu íntimo, circunstância afetiva peculiar. Sim, porque no final da passada década de quarenta, meus pais, Adauto e Walneide, nas asas de paixão avassaladora deixam seu berço e seguem para o sitio onde nasci – Salvador – juntamente com meus irmãos e ali se estabelecem, até quando nosso patriarca mudou em definitivo de plano. Dona Walneide, invadindo a casa dos noventa, ainda passeia sorridente e augusta, nas plagas que escolheu como segunda urbe.

Muitas vezes, as obrigações que me traziam até o canto dos meus ascendentes, não permitiam pudesse visitar avós, tios, primos – um deles, Mima, investigador e instrutor de tiro da ACADEPOL de Pernambuco – e rever as praças, ruas e avenidas, onde tudo começou, para aqueles a quem devo tudo, seja na capital, em Casa Amarela, onde mamãe foi criada, ou nas bandas de Gravatá de Bezerros, berço do velho Gomes, mas, quando fazia sentia no ar o cheiro inconfundível daqueles que me deram a vida, em todos os cantos por onde passava, da forma na qual até hoje sinto.

Voltando a Romero e usando conhecido jargão digo ter voado o tempo para nós, muito embora, não seja privilegio nosso, dita dinâmica. Destarte, nas asas do atrevido corcel, assim como pude fazê-lo, ele foi construindo sua história de sucesso, claro, driblando dificuldades, enfrentando percalços, desafiando tempestades, mesmo porque a vitoria não pertence aos acomodados. Destarte, Leal, destemido e intenso resolveu encarar novos desafios.

O homem de polícia consagrado, não abandona a insígnia, pois, todos aqueles que verdadeiramente trazem no sangue e na alma, a verve do combatente frente ao crime levam seu o distintivo para eternidade, com ele não é e não será diferente, entretanto, a vontade de servir ao povo de seu rincão natal, o incentivaram a navegar nas águas efervescentes da política, então, se torna prefeito de Vertentes.

Vão-se quatorze anos desde quando Romero Leal fez sua primeira assunção, na condição de alcaide cuidando, a partir dali, por transformar as paragens de Vertentes, sede e distritos. Arrumou seus sítios todos, levou água e calçamento aos pontos mais distantes do município, abriu acessos na sede, asfaltou ruas, atentou para a educação, saúde pública, promoveu assistência aos menos favorecidos, buscou oferecer, sobretudo a estes, oportunidades de trabalho, a fim de que não se tonassem reféns do clientelismo viciante, organizou as contas publicas e claro, não perdendo o leme de velho capitão deu ênfase a segurança local.

Ditas assertivas, não chegam a estas linhas, no bonde lento do ouvir dizer, surgem na locomotiva veloz de um privilégio. Desde a última segunda feira, eu e minha amada Roberta somos hospedes de seu clã, destarte, Romero e Dra. Rejane, seus filhos, Romerinho, Rodrigo e Rafaela, a partir de nossa chegada, no Aeroproto dos Guararapes têm se desdobrado para fazer de nossa estada em seu reduto, uma apoteose. Desde os cuidados materiais mais simples, aos prazeres inolvidáveis do repouso e mesa culminando no carinho que nos foi dispensado, refletido nos beijos e abraços dos netos, querubins capazes de enlevar nossos momentos, enquanto hóspedes no sito de Vertentes.

Isto sem falar nas manhãs, tardes e noites, de Muro Alto e Porto de Galinhas, palco onde a natureza foi testemunha das conversas prazerosas desfiadas, meios lúdicos de transporte ao tempo onde vivemos tantas histórias de polícia, razão de nossa amizade indestrutível, muito embora guarde a certeza de que nossos cordões umbilicais remontam a eras sumidas.

Em todos os lugares onde estivemos nos derradeiros dias, anjos da guarda, figuras que lhes acompanham, dedicados colaboradores e personagens tantas do cotidiano em que fomos acolhidos desdobraram mesuras, capazes de fazer sentir, no corpo e alma, a brisa leve só existente em paraísos encantados.

Agora, frente ao mar de Boa Viagem, embevecido pela beleza do cenário descortinando o horizonte, além dos arrecifes, das areias brancas, do mar verde e das espumas alvas e densas, no santuário de Rejane e Romero, às vésperas do retorno ao nosso refúgio que visa as arvores centenárias do Campo Grande, em Salvador, para onde a saudade já acena, apesar da fidalguia que nos foi dispensada, na esteira do sincero agradecimento por tudo ofertado entendo a razão transcendente encerrada no teu sobrenome, caro amigo. Tinha que ser Leal.

Boa Viagem.