nando da costa lima

Por Nando da Costa Lima 

“Nós nascemos do mesmo signo, doutor, com a única diferença de eu ter nascido de nove meses de gestação e sua excelência ter nascido de dez…” Quando o professor e poeta Manoel Fernandes de Oliveira (Maneca Grosso) publicou este artigo no jornal “A Palavra”, chamando o adversário de “filho de uma égua”,o clima ficou ainda mais pesado entre os dois grupos políticos que lutavam pelo poder no início do século XX. (Meletes e Peduros). Os Meletes se defendiam e atacavam os Peduros através do jornal “O Conquistense”. O juiz Araújo, um intelectual erudito, ficou muito irritado com as palavras a ele dirigidas. Naquela Conquista de 1919, os muros ainda criavam limo devido à umidade das matas que circundavam a cidade, o comércio era movimentado pelos caixeiros-viajantes e a Filarmônica Vitória marcava presença em todo grande acontecimento. Uma pequena cidade escondida no sudoeste baiano, mas que aos olhos do poeta: “Não há no mundo, na Terra, igual a esta outra vista! Na falda d’aquela serra… Está engastada Conquista”.

Coronel Gugé tinha falecido recentemente e isto contribuiu para o fortalecimento da oposição. O último artigo de Maneca tirou os Meletes do sério, sua desenvoltura levava-o a ganhar todas as polêmicas levantadas. Com uma disputa verbal tão agressiva, o povo já contava com uma luta armada a qualquer momento. As discussões entre Meletes e Peduros a cada momento se agravavam mais, a cidade estava tensa, só se via homens armados, tinha jagunço de todo lugar! O clima de guerra preocupou até o Governo do Estado, que só veio tomar providências depois que os Meletes começaram a incentivar o povo a não pagar impostos, destacou uma tropa para prender Arruda, um chefe de jagunços, já com o intuito de mostrar que não estava gostando daquilo. O tenente responsável o enviou para a capital escoltado por vários soldados, mas os seus aliados não deixaram a operação ser completada, cercaram a tropa e libertaram Arruda, uma figura necessária para a ocasião, foi ele que usaram para emboscar o poeta Maneca Grosso e seu compadre. Quanto à tropa: ninguém sabe onde foi parar. Um amigo ufólogo e historiador acha que a única explicação é que eles foram abduzidos, com burro e tudo, perto de Boa Nova. Disso eu não tenho certeza.

Maneca gostava de ensinar, foi professor durante toda a sua existência, talvez a única maneira de conviver com poesia na época sem ser chamado de doido. Nos seus três últimos anos é que se viu envolvido numa disputa política que lhe custou a vida. Enquanto a arma usada era a caneta, ele venceu quase todas as batalhas, mas quando a caneta foi substituída pela “repetição papo amarelo”, o poeta não resistiu. Enquanto viajava daqui pra sua fazenda na Baixa do Arroz em companhia do Compadre Cirilo, foi emboscado perto do Simão, Cirilo morreu na hora, ele foi espancado não morrendo no local graças à interferência casual de um vaqueiro. Maneca era diabético e faleceu pouco tempo depois do ocorrido, não se sabe se o que o matou foi a agressão ou a depressão por ter sido agredido fisicamente apenas por falar o que sentia em relação à política da terra que tanto amou. Também não podemos canonizar o poeta. Ele, como todo cidadão comum, optou por um lado, esse tema é muito controverso.

A surra sofrida pelo poeta, foi o que levou Dino Correia, um ex-aluno do professor Maneca, a entrar na disputa política e decidir a situação através das armas em favor dos Peduros. Uma rusga que o tempo apagou a razão…, do poeta ficaram os versos inocentando Conquista, sua grande paixão – “Por ti Conquista, se sofri não nego! Nem te renego, como sabe Deus! És inocente, não me deste a morte Mas fora sorte… Fora o fado… Adeus”.

A história de Vitória da Conquista é repleta de momentos pitorescos, nossos escritores e artistas voltados às artes cênicas deveriam levar aos palcos e às telas as centenas de fatos que aqui ocorreram. O incentivo das universidades e o apoio financeiro dos nossos empresários seriam fundamentais nessa empreitada. O povo que habita e passa por Vitória da Conquista precisa conhecer melhor sua bela história. Ela é sublime.

P.S. Essa história tem outras versões (eu escrevo ficção, não sou historiador).