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O xerifão, elegante, de risada cadenciada, parecia programada, automática, mas não, era espontânea, como se quisesse dizer aos que estivessem ao seu lado: fique tranquilo, eu não tenho arma, eu tenho uma caneta e um livro.

Além de ler muito, Valdir, o frequentador do Aerobar, balançava o copo de whisky, mexendo com os dedos o gelo que fazia a bebida importada descer com mais suavidade.

A sua caneta, quase sempre, era para dedicar palavras de agradecimentos a Vitória da Conquista, a cidade que o acolheu, e mais ainda, escrever palavras de amor dedicadas a sua amada esposa Roberta, por quem era apaixonado.

Definitivamente, não nos definimos, e muito menos podemos definir os outros, julgá-los. Por isso mesmo ainda não entendemos porquê Valdir Barbosa partiu assim tão breve, sem avisar, sem trocar tiros com possíveis “foras da lei” que ele sempre combatia.

A fragilidade humana é tão forte, tão violenta, tão silenciosa quanto um vírus que surpreende a humanidade. O xerifão foi embora, fará falta, deixou um vazio junto aos seus familiares, esposa e filhos, uma incógnita na cabeça dos amigos.

Ontem, 12 de junho, Dia dos Namorados, Valdir deveria estar com a discreta esposa, a psicóloga Roberta, sentado à mesa de um fino restaurante, desfrutando um jantar especial. Logo cedo o xerifão, com o espírito voltado para comemorar a data, escreveu um belo texto para o seu inseparável amor e deixou claro que se pudesse lhe daria o mundo. Antes de deixar o último escrito de Valdir, o homem que parecia de ferro, eu vou à Feirinha da Escola Normal entender e agradecer a vida: “Hoje, somente essas flores lhe ofereço, mas muito mais queria lhe presentear. Viraria este mundo pelo avesso…”

Em tempo: Valdir, no último dia 04/06, escrevera esse texto dirigindo a si mesmo aos céus. Enfim, parece que sua alma possuía uma doença imperceptível, parece que ele pedia socorro:

“CONFUSO

Do que sirvo eu, se já não sirvo,

Quanto serves tu, se não me serves ,

Qual minha serventia, só porque vivo?

Já que não me atrevo e nem te atreves,

Ontem, fostes tudo, em minha vida,

Tentei ser também, bom para  ti,

Porém, a realidade dolorida,

Revela, quanto choro há no que ri,

Sigo, a perguntar, me consumindo,

O hoje, o amanhã, quanto  passou,

Portas fechadas, outras vão abrindo,

Meus refletires deixam-me obtuso,

Não sei se sigo, ou fico aonde estou,

Antes era o certo,  agora estou confuso.

Imbassaí, junho, 2021

valdir barbosa”