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Com o advento da pandemia o mundo precisou se reinventar para continuar funcionando nos mais diversos setores, quem não se adaptou ao avanço tecnológico encontrou dificuldades para conseguir seguir em frente no mercado.
Com a educação, claro, está sendo assim também. O professor Omar Costa, diretor pedagógico do Zênite, conversará amanhã com os seus alunos, pais/responsáveis, através de uma live, a partir das 19h, e vamos tentar antecipar alguma coisa para os leitores do nosso blog:

B M: Omar, muito antes de começar a pandemia ouvi de você a seguinte frase dentro da sua sala, no Zênite: “precisa discutir a educação. Você está vendo aqui? Não estou em contato direto com os alunos? Pois é, não consigo conversar tudo com eles, já não conseguimos falar a língua dos jovens!” Reagi assustado, como assim? Perguntei-lhe. Você poderia, através desse bate papo, externar para o nosso público o que você falou para mim:

O C: Olá, Massinha! Agradeço a oportunidade de poder utilizar esse canal de comunicação pra externar o sentimento que venho tendo há algum tempo sobre a educação que consegui vivenciar como estudante, professor e gestor de um espaço educacional.
No decorrer da história nós podemos perceber o papel da educação, ela sempre atende aos anseios de quem domina as relações sociais e, muitas vezes, reflete as demandas dessa dominação e quase sempre os dominados não conseguem superar. Na Grécia Antiga, a educação era para poucos. Tinha o foco nos ensinamentos da escola aristocrática, partia do modelo  dos heróis das narrativas homéricas, para deles imitar as virtudes que tornariam o homem o melhor possível e, reproduzia assim, aquelas características que encontramos nas obras de Homero. Características que er exigências da civilização grega da época. Mais pra frente, chegamos na idade média, onde a educação também era para poucos, mas ela atendia aos interesses da classe dominante e consequentemente os interesses da sociedade vigente. Lá para o final da idade média percebemos um novo formato social e o surgimento de uma burguesia  com novos anseios. A educação inicia um processo de saída dos locais sagrados e surgem as Universidades, claro que ainda para uma minoria. Vem a primeira revolução industrial no século XVIII e passamos a  ter uma educação um pouco mãos amplamente, porém voltada ainda a formação daqueles que comandavam, mas precisavam ensinar a usar as máquinas. Nesse processo todo temos uma educação que tem seu foco em produzir material humano capaz de atender aos interesses dos que dominam. A educação é e sempre foi um projeto de quem detém o poder. E não poderíamos esperar algo diferente da classe dominante, ela sabe que a educação liberta e a libertação dos dominados causaria e causa desconforto para os algozes. Hoje vivemos algo ainda assim, a educação a serviço da dominação, e alguns núcleos buscam disseminar o processo educativo com o objetivo de democratizar o conhecimento e romper com as amarras que impedem a sociedade mais justa. Hoje ainda temos uma educação da primeira e segunda revolução industrial. Uma educação que entrega a coisa pronta, que tem o estudante distante do protagonismo. Porém, nós temos uma Sociedade da Informação, S.I, que tem inúmeras tecnologias de informação e comunicação disponíveis e que exige das escolas uma transformação enorme. Eu diria pra você que nada das escolas que temos serve para sociedade atual. Os professores precisam sair do papel de únicos dotados do saber, as carteiras enfileiradas precisam deixar de existir para que a gente não se pareça com uma fábrica, até as fardas das escolas deveriam deixar de existir, e dar espaço a costumização das vestimentas. A recuperação, as séries, tudo isso é exigência dos séculos XIX e XX, e nós estamos no século XXI. Então, os jovens são do século XXI e a educação é dos séculos passados. Respondo a pergunta que me fez com outra pergunta:
– Você acha que isso tem como funcionar?!
As necessidades são outras. Ao chegar num restaurante, você pede a senha do Wi-Fi antes de abrir o cardápio, ao fazer uma viagem com a família para uma casa de campa naquele lugar que você tanto sonhou e que você acha que será a coisa mais importante pra sua família, seu filho pergunta: “pai, lá tem Wi-Fi?”
Você faz a festa de São João com as bandas de destaque da nossa época e eles só querem um “paredão” de som. Não nos comunicamos com os jovens do século XXI porque não nós disponibilizamos a criar uma escola que atenda as demandas do século XXI. É esse século gerou jovens menos comandados, jovens menos passivos. As redes sociais e a internet abriram um movo mundo para os jovens, nesse mundo eles são protagonistas e, muitas vezes, esse mundo digital entra em conflito o mundo analógico das gerações dos pais e educadores uma forma geral. Precisamos demolir as escolas. Precisamos construir uma escola “digital”, a escola que busque resolver problemas práticos, uma escola que entenda que nem todos querem ser mestre e doutores, mas todos querem ser valorizados. Uma escola que aproxime as demandas sociais do mundo acadêmico, uma escola que aproxime a ciência da vida real, uma escola que busque o valor da ciência não só na fora da pandemia, mas no dia a Diaz uma escola que busque entregar o futuro aos jovens, a chave da produção do conhecimento. E te digo uma coisa, Massinha. Se não fizermos isso logo, vamos criar uma barreira intransponível entre gerações.

B M: É possível que as direções das escolas, dos cursinhos, os reitores, eles estarão abertos a dividir as discussões com os alunos? Estarão disponíveis para aceitarem o protagonismo dos alunos, ser questionados incisivamente ao ponto de descerem do podium das direções e também do lugar de destaque da sala de aula?

O C: Isso era pra ter acontecido antes da virada do século XX para XXI,  as academias sabiam da transformação, mas utilizando de um ditado popular, é difícil largar o osso.
Vivemos um momento que não temos respostas prontas, nem na ciência, a pandemia tá aí pra nos mostrar. E o problema é que nossos espaços educacionais possuem uma dificuldade enorme de entender que sua estrutura não atende mais as demandas, romper isso será difícil.
Mas aos poucos vamos encontrando exemplos, exemplos até antigos como a escola da Ponte fundado em 1976 pelo José Pacheco e que em 2000 recebe a classificação de eco-escola.
Não é difícil, as ferramentas todas estão aí.
Em Vitória da Conquista no ano de 2019 você presenciou uma tentativa de construção coletiva, envolveu apenas algumas escolas privadas da educação básica no município, algo bem incipiente já que a educação privada compreende apenas 15% dos estudantes brasileiras, mas todo grande feito surge de pequenas ações.
Eu não sou daquelas pessoas que são esperançosas e ficam esperando um milagre.
Essa transformação exige coragem e ação rápida, e eu estou provocando essa discussão em todos os lugares que vou.

B M: Professor, já agradecendo a sua participação, é oportuno perguntar, diante desse quadro de incertezas, o que ocorrerá com ENEM? É possível que se prorrogue, e caso ocorra na data prevista, existe uma preocupação por parte de muitos em relação aos alunos que não têm acesso a internet, e se o tem, às vezes não é a de melhor qualidade. A concorrência é justa?

O C: Manter a data do Enem é de uma irresponsabilidade enorme.
Sabemos que 58% dos domicílios brasileiros não possuem computador, 32% dos domicílios brasileiros não possuem internet e 85% dos estudantes brasileiros estão nas escolas públicas.
Como manter um Enem para novembro se a maioria das escolas públicas não estão tendo nenhum tipo de atividade e a grande maioria dos dados que forneci são, logicamente, da classe social menos favorecida e que tem seus filhos nas escolas públicas.
O governo federal fez uma propaganda para televisão e redes sociais que demonstra uma clara posição do governo para atender aos interesses dos privilegiados, todos os estudantes na propaganda eram estudantes num ambiente com internet e smartphone, e um discurso que faz parecer que todos os jovens brasileiros possuem as mesmas condições para estudar.
O Enem precisa ser adiado para o primeiro e segundo domingo de janeiro, ou mesmo para meados de janeiro.
Isso vai alterar o calendário das universidades, das escolas públicas e privadas, sim. Mas o que não sofrerá mudanças nessa pandemia ?!
Minha posição não é solitária, existem inúmeras entidades estudantis com a bandeira #AdiaEnem. Tem também muitos estudantes que sabem que são privilegiados mas são conscientes e entendem que a manutenção da data para novembro vai prejudicar inúmeros jovens.