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Por Monalisa Barros*

monalisabarros_02Tenho um filho de 12 anos, ano passado ele passou a estudar numa grande escola da cidade, na 5ª série, atual 6º ano. Como ele passaria a levar dinheiro para comprar a sua merenda eu o orientei a ter alguns limites: não deveria comer sempre frituras, deveria evitar refrigerantes, deveria procurar lanches mais saudáveis… Já no final da primeira semana ele me disse que era impossível seguir as orientações. O copo do refrigerante era um terço do valor do copo de suco, a maioria dos lanches eram fritos e todos compram chocolates, balas, chicletes e que ele seria o único a não comer estas coisas.

Logo depois houve uma reunião de pais na escola e eu coloquei que havia uma incongruência entre dois projetos pedagógicos desenvolvidos pela escola e a sua cantina! Os projetos que eu me referia são o de gestão financeira, que ajuda a criança a entender um fluxo de caixa diário fazendo planejamentos, economia, arrecadações para cobrir as despesas anuais da turma nos diversos outros projetos da escola e o projeto de sustentabilidade e educação ambiental. Ambos projetos excelentes, mas que precisam ser vividos integralmente no dia-a-dia da escola e não apenas em momentos específicos, pois assim, perderiam a potência de transformação.

Não adianta estudar sobre a vida saudável, sustentabilidade e oferecer comida de fast food e guloseimas como alternativas à alimentação. Não adianta ensinar a economizar para construir planos coletivos se o mais barato é comprar comida com baixo valor nutritivo e potencial efeito nefasto para a saúde.

A reação da porta-voz da escola foi horrível. Ela disse que estamos num país democrático e que a escola não poderia proibir a venda de alguns tipos de alimento. Depois emendou outro argumento dizendo que a cantina era terceirizada e que eles não poderiam interferir no cardápio. Duas falácias!!!

A escola é privada e pode sim definir o que a cantina terceirizada pode e deve vender! Quanto ao argumento da democracia, deu vontade de rir! Sendo assim, a escola não poderia impor um tipo de uniforme ou mesmo uma lista de livros didáticos! Que compreensão rasa de democracia? Pois bem, vivemos 2015 assim, em meio a chocolates, balas, frituras, refrigerantes, raramente um iogurte, uma salada de frutas ou um salgado assado seguido de um suco!

Este ano viemos morar na Europa. A escola que o meu filho frequenta além de não vender estes itens, não permite que ENTRE nas dependências da escola este tipo de comida. Nem nas festas! Será que aqui eles são menos democráticos?

Não, aqui eles entendem que o papel da escola na formação da criança não passa apenas pelo acúmulo de conteúdos didáticos, mas nas vivências saudáveis! A escola possui uma horta. As crianças incorporam tão rapidamente estes limites que até mesmo quando um dia fiz menção de colocar um pedaço de bolo de cenoura com calda de chocolate para a merenda, o meu filho se recusou a leva-lo. E me lembrou que não podia levar chocolates!

Além disso, ele tem aulas de atividades de vida diária e este mês trabalharam como cuidar de um bebê, desde como trocar uma fralda até como fazer uma mamadeira ou papinha em caso de fome e lavar depois. As atividades físicas tampouco se resumem a uma bola com uma quadra disponível. A cada trimestre eles conhecem 2 esportes diferentes para que no ensino médio possam se dedicar ao que mais lhe chamou a atenção. Ou seja, a formação não é dicotômica, é integral e não requer grandes tecnologias ou investimentos especiais, apenas determinação e compromisso real com a formação de um novo cidadão, para além de apenas conseguir uma boa pontuação no ENEM.

Os vereadores da nossa cidade poderiam legislar sobre a causa e impedir o acesso de alimentos não saudáveis nos espaços escolares; e as escolas poderiam assumir seu papel de forma mais compreensiva e ampliada. Bem como os pais deveriam cobrar que tais coisas aconteçam, pois é esse cidadão que atuará no mundo e para tal precisa estar saudável e preparado. Eles não são o futuro do Brasil?

*Psicóloga, mestre em pesquisa aplicada á população pela Universidade de Exeter, Inglaterra, Doutora em psicologia pela UFF, Niterói, RJ e atualmente em pós doc no grupo de pesquisa Maternity Care, pela Trinity College Dublin, Irlanda. Professora de saúde coletiva do curso de medicina da UESB de Vitória da Conquista. Membro do grupo de Cirandeiras de apoio ao parto humanizado.