manno_goes

Manno Góes é um excepcional baixista, foi do grupo Jheremmias, depois do Jammil, parceiro de Tuca Fernandes, os dois já embalaram os foliões do Massicas no trio e no palco.

Cabe um parêntese: Certa feita eu fui convidado a participar de um bate papo com um produtor de Salvador no Livramento Palace, ele veio a pedido do empresário do Jammil, que me impunha uma condição para a banda de axé mais rock’n roll da Bahia continuar trabalhando comigo: “olhe, o homem mandou lhe falar que você tirasse Ivete da grade do Massicas na Micareta de Conquista, senão o Jammil e Araketu sai”, me falou o produtor sem cerimônia. Ivete havia deixado a Banda Eva pra fazer carreira solo. Terrível, né? Jammil e Araketu voltaram a tocar comigo após mudar de produtora.

Voltemos ao inquieto e positivo Manno Góes: Manno é um poeta, sensível, humano. Ele escreveu algo que nos toca profundamente e que vale a pena compartilhar, trata-se de uma manifestação de amizade e carinho:

“Bar do Beliska.

Ondina. Anos 80. Salvador. Bahia.

Minha juventude era aquela da propaganda de refrigerante cantada pelos Engenheiros do Havaí.  Pós Geração Coca-Cola, mais rígida.

Estudávamos no Marista.

Antes de percebermos que aquilo ali não era uma escola; mas na verdade uma fábrica de facistas, corruptos e herdeiros babacas, salvo raras exceções, achávamos realmente que estávamos sendo preparados para a vida; não para uma bolha.

O Maristas, com seu mecanismo de motivação burguesa e elitista, criou gerações de acéfalos endinheirados e abobados.

Porém, ao mesmo tempo, desenvolveu aptidões artísticas e empresariais em guris de classe média interessantes, sem sobrenomes famosos ou cargos garantidos pós-vestibular.

O Marista era uma selva de pedra e gentilezas; de contradições e afetos.

Palco em que Dona Lícia e Zé Carlos administravam, cada um à sua maneira, sua manada de meninos boçais, entre vagais e cdfs; imbecis e interessantes, mas todos com suas particularidades cheias de hormônios e alguma boa vontade.

O Marista produzia do lixo ao luxo em questões de recreios, nos quais mistos quentes e coca-colas sem gás produziam não só calorias, mas convívios barulhentos entre adolescentes brancos entupidos de tesão e tensão, doidos para acasalar e entender o mundo além das aulas de religião.

E dessa geleia de futilidades, curiosidades e soberba surgiam, às vezes, personagens interessantes.

Um desses personagens icônicos e inesquecível do Marista é Sergio Ricardo Amaral. Vulgo Beliska.

Beliska é pequenino. Atarracado. Tem um maxilizar protuberante e sempre foi corajoso e troncudinho.

Não jogava porra nenhuma, mas não perdia um baba. Demonstrava uma raça incansável em cada dividida e chute a gol. Característica essa que o levou a uma posição de destaque na ponta direita do time do handebol da escola.

Beliska e sua família me fizeram descobrir o carnaval. Foi através deles que fui para os primeiros bailes do baiano e da associação atlética. Tomei gosto. Deu no que deu.

Beliska também foi o cara que abriu um bar no anexo de sua casa em ondina e que me incentivou a tocar profissionalmente. Manno é Átila: dois amigos que tocavam violão em “Mar Grande, alto astral” e que de repente recebem um convite para tocar, em troca de cachê, num bar que estava começando a bombar.

Cronograma da casa:

Quinta feira: Tuca, cantor do diário oficial.

Sexta feira: Uma cantora gata que todos adoravam e que era muito legal, revezando com Andrezinho, amigo do Marista desejado por dez entre dez colegas da escola.

Sábado: Cinho da Matta; talento e virtuose puros, além da minha capacidade.

E vem o convite;

“Manno; toca quarta com Átila”.

Claro!!!

“Mas, olha; as condições são diferentes. Não posso pagar o cachê que pago pra tuca, entende”?

Claro!

“Não me pague nada. Só Me dá os converts artísticos”.  – respondi

Foi minha primeira tacada de sorte no ramo musical.

O bar dia quarta bombou e eu e átila passamos a ser os artistas da casa mais bem remunerados.

Daí surgiu a banda Ligth de Átila; minha amizade com Tuca e o alvorecer da cantora gata que tocava lá dia sexta: Ivete Sangallo.

Da minha amizade com Tuca vieram Jheremmias, Jammil e mil e uma noites de shows e alegria.

Beliska está com Covid.

Uma situação inesperada para mim, que recebi dele tanto afeto e carinho nas mortes de meu irmão e meu pai, tudo no ano passado.

Beliska não deve morrer.

As histórias boas e inesquecíveis da gente não devem morrer.

Eu não quero que Beliska morra.

A morte de Beliska é também a morte de minha história. Da história de Tuca, de Átila, de Ivete e de tanta gente. Da família dele. Dos amigos dele. Da galera que ficou puta com ele quando ele fez merda.

Eu não quero que o velho Belis morra.

Não morra, Bélis.

Na moral. Não morra, irmão.

Eu preciso antes te agradecer muito por tudo que você me proporcionou, sem que eu me atentasse.

Te agradecer por acreditar em mim.

Te agradecer por sua amizade.

Te agradecer por estar na missa de Dé Bombinha.

Por estar comigo na praia, no dia do meu divórcio.

Belis. Resista, irmão!

Ouça daí cada música que cantei em seu bar, com o coração cheio de juventude e inocência.

Antes de saber que iria viver de música.

Respire, seu sacaninha.

A gente ama vc.”