WhatsApp Image 2021-02-01 at 11.20.44

Está anunciada o retorno das aulas para a próxima quarta-feira, 03/02, em Vitória da Conquista, e o alunado vive dias de ansiedade, afinal, tudo que a turma quer é a volta às aulas, o reencontro com os colegas, os abraços e beijos, tudo guardado para esse momento mágico, preso, desde o ano passado.

Só que ainda não será desta vez que vai acontecer o carnaval tão esperado por todos, as aulas começarão sim, só que online, presencialmente só mais à frente, e exatamente por isso diretores das escolas da rede privada e pais de alunos reuniram com autoridades cobrando uma posição sobre o início das aulas presenciais.

Do outro lado da ponte, tem um personagem importantíssimo nesse processo que está sendo ignorado, e ele lamenta profundamente esse descaso, “pois é impossível começar as aulas sem o professor. Estamos sendo ignorados, é muito descaso com quem tanto faz pela educação”, reclama, coberto de razão um mestre com a voz trêmula de indignação. E esse problema não é só em Conquista, é no Brasil inteiro, veja o depoimento de uma professora em nome da categoria:

“Hoje eu quero partilhar um texto com vocês. Seguidamente ouvimos debates no Brasil sobre o retorno às aulas durante a pandemia. Sobre o assunto falam infectologistas, médicos, falam as mães, secretários de educação, prefeitos, vereadores. Ministro da Educação não fala porque não temos, ou temos? Falam os alunos, repórteres, falam os programas de tv, só não falam os professores, e o pior, nem sequer são mencionados nesse processo, como se não fizesse parte dele.

Hoje cruzei pela televisão com o programa chamado Encontro, sentei para ver a simulação de uma sala de aula onde uma tinta foi usada para representar o novo Coronavírus. Detalhe: nessa simulação só havia duas pessoas na sala de aula, em pouco tempo mesas e objetos foram tomados pela tinta florescente que representava o vírus, em seguida uma especialista foi entrevistada, não prestei atenção no nome ou especialidade, ela falou no processo de volta as aulas presenciais, ela mencionou sobre o retorno escalonado para que as salas não fiquem lotadas, minimizou o perigo desse regresso ao dizer que as crianças, na maioria, não são infectadas, e quando são, apresentam sintomas leves. Citou também a importância da escola para a criança, mas não falou do professor nunca, uma única vez. Por puro vício de linguística que adora a análise do discurso, eu fiquei contando nos dedos as vezes que ela pronunciava a palavra criança, perdi a conta, foram muitas, ao mesmo tempo que esperava ela pronunciar a palavra professores, não houve. A eterna invisibilidade do magistério brasileiro gritava nas palavras dessa senhora e me embrulhou o estômago, estava ali naquela fala, vergonhosamente escancarado, o desrespeito pelos professores e a visão que a sociedade possui da escola, quando uma categoria tão fundamental nesse processo sequer é mencionada é porque não existe para esse sujeito do discurso, os professores excluídos desse processo, a escola é reduzida ao espaço de socialização, depósito de crianças para que os pais trabalhem, tudo para que os adolescentes não fiquem ansiosos, a escola passa a ser tudo, menos espaço para a construção do conhecimento.

A omissão da palavra professores quando se refere a esse retorno é também um desrespeito as nossas vidas, como se a nossa vida, a nossa saúde, não fosse importante. Penso no quadro docente da nossa escola, e através dele traço um parâmetro, poucos não estão no grupo de risco, a maioria possui comorbidade, entre os jovens e saudáveis estão as grávidas, isso sem considerar a carga de trabalho dos profissionais, muitos trabalham em mais de uma escola, e em escolas de cidades diferentes, e precisam de transporte público. Fico pensando no nosso esforço para manter a qualidade de ensino nesse ano letivo atípico, fomos pegos de surpresa como todos, a maioria de nós nunca estudou para dar aula a distância, aprendemos na marra, no susto, nossa casa se transformou num estúdio, nosso celular em instrumento de trabalho, nossa voz para dez turmas, cerca de quatrocentos alunos e mais os seus pais, no meu caso.

Em tempos de aulas presenciais, meu celular ficava no silencioso para não perturbar, agora também, porque muitos alunos e pais não respeitam dia e nem horário, trabalhamos em duas plataformas e quatro frentes. Todo dia chega uma nova exigência, a mais nova é postar o plano de aula na íntegra, também no diário online.

Quando falam em retorno, falam no retorno escalonado para os alunos, e o retorno dos professores também escalonados ou teremos que assumir tudo, aulas presenciais e a distância? É sobre isso que os nossos sindicatos precisam ficar atentos, não há como dá conta de aula presencial e a distância ao mesmo tempo. Se for assim, se não morrermos de Covid, vamos morrer de exaustão. Ainda tem as lives, quase todo dia, para que os professores escutem, escutem e escutem. Quando nos será concedido um lugar de fala em tudo isso? O magistério é silenciado na educação brasileira desde o Brasil colônia, as decisões vêm de cima, de especialistas que já não estão mais na sala de aula há tempos. Mais que ouvir, necessitarmos também falar e acima de tudo ser ouvidos”.