Cassiano Ribeiro, o Coronel Cassu: na sua narrativa estão Picasso, Dali, Elomar e Xangai
“Alô, Amigos do Fim do Mundo. Recentemente eu estive com o meu primo, o amigo Xangai, secretário de Cultura aqui em Vitória da Conquista, e conversamos sobre diversos assuntos de uma viola plangente pontuando, ele apanhou um casulo de cigarra, que é a casca, e me mostrou e recitou que para ele é o mais belo hai-kai conhecido do Bashô, o poeta japonês que praticamente fundou esse gênero. Olhou pra casca e disse: casca oca a cigarra cantou-se toda, realmente um belíssimo hai-kai, mas quero informar de público em primeira mão ao amigo Xangai que esse é o segundo mais belo hai-kai. O primeiro hai-kai, desculpe a vaidade, é meu, eu vou contar a circunstância, a entourrage, pra poder criar uma atmosfera, um stimmung, como dizem os alemães.
Eu estava numa esquina esperando uma garota chamada Mari, isso tem muitos anos, e ela demorou, eu comecei a sentir que ela não vinha mais e tudo parecia desaparecer no frio esplendor do nada, pois você projeta a sua tristeza no mundo, você tira a cor. Estava chovendo no jardim ao lado que tinha umas roseiras na frente da casa e uma chuva anunciada em gotas vigorosas lancetavam as pétalas das rosas que iam caindo e eu olhando aquilo pensando em Mari que não vinha e na minha tristeza, eu disse tarde chuvosa me fez chorar as pétalas de uma rosa. Isso é muito amor, isso veio do fundo do coração.
Eu disse que era o mais bonito, desculpe a vaidade. Salvador Dali também era vaidoso e era um grande artista, porque eu introduzi Salvador Dali pra puxar um outro assunto aqui e tem a ver também com essas cibeteses, essas competições pra saber quem é pior ou quem é melhor.
Perguntaram certa feita a Salvador Dali em uma entrevista qual a diferença entre ele e Pablo Picasso, o entrevistador era francês, o Dali disse: Picasso é um brilhante artista, eu também sou; Pablo Picasso é espanhol, eu também sou; Pablo Picasso é comunista, eu tão pouco, e aí ao dizer isso em francês ele diz: Moi Non Plus, e acabou criando uma expressão nova, uma expressão nova dentro da língua, gênio tem essas coisas.
O Serge Gouinsbiurg chegou a fazer uma música Je T’aime Moi Non Plus, Eu Te Amo Tão Pouco, que aí certamente ao ouvir esse mote xistoso do Dali, e ficou essa expressão. Então, porque eu estou citando, porque eu estava falando essa história do hai-kai pra uma live com uns amigos em São Paulo? Um deles me perguntou assim: Cassiano, e no contexto da arte e da poesia, qual a diferença sua para Xangai? Aí eu respondi, eu falei assim, o Xangai, ele é conquistense, descendente do Coronel Gugé, eu também sou; um artista muito criativo, competente, eu, modéstia parte, também o sou. O Xangai também é um admirador profundo da obra do Elomar Figueira, eu, Tão Pouco, Moi Non Plus, então, encerramos assim?
Vou pedir Xangai pra ele tocar a versão sertaneja de Je T’aime Moi Non Plus, e eu fico aqui, modéstia a parte, no meu ritmo da chuva, Olho Para a Chuva Que Não Quer Parar, Nela Vejo o Meu Amor… voltando ao poema, Pétalas das Rosas, Essa Chuva Ingrata Que Não Vai Passar, Não Vai Levar a Minha Dor”.