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Aquelas santas sextas, por Valéria Figueira

As experiências de criança se imprimem na alma da gente feito tatuagem no coração.

Todas as semanas santas da infância e adolescência eu passei na roça com meu pai. Ficava entre Tremedal e Belo Campo, se chamava Lagoa de Pedras, com muitas pedras e pouca lagoa.

Meu pai fazia moqueca de peixe, porque carne de boi, cremdeuspai, podia não.

O sol quente revezava com uma imensa lua cheia, naquele clarão da caatinga, que iluminava encantos e lendas.

Na sexta feira da paixão, todos sabiam quem virava lobisomem na região. Era sempre o mais quieto e mais isolado, o suspeito.

Havia um silêncio longo, que só era quebrado com as recomendações de resguardo de Anália; sob pena de castigo divino; não podia trabalhar, não podia montar em animal, nem brigar os menino unsunsoutro, nem sequer barrer a casa.

Não podia matar as moscas que teimavam em descansar em minha pele, nunca na roupa, restava a mim, me balançar.

O dia custava a passar, porque na minha roça de criança nunca teve TV, daí eu aprendia a brincar de vó com Sirlene, passando pedrinhas, uma a uma, entre os dedos no chão. Folheava uma revista velha, descascava uma laranja e ia chupar na rede.

Aleluia, chegava o sábado e eu via queimarem o judas, impiedosamente, como se fosse ele o culpado de toda ruindade do mundo.

No domingo painho me dava um ovo de chocolate chamado diamante negro, e eu repartia com meus amigos da roça, tudo derretido, lambuzando os dedos que já não estavam limpos.

Hoje sexta feira santa de 2024, cheguei na fazenda e já dei de cara com Domingos, o vaqueiro, apiando do cavalo, vindo da manga.

O povo da casa tinha quebrado o jejum com sanduíches de pernil.

Além de TV, a roça de hoje tem ar condicionado, e cada um tem um celular conectado a Wi-Fi.

O Judas eu acho que finalmente pagou os pecados dele, porque ninguém nem ouve mais falar.

O diamante negro ainda existe, mas mudou, toda vez que eu provo penso que tem açúcar demais, ou vontade de menos.

Resta esperar que a lua cheia continue a mesma.

Aqui matutando lembrei que do meu tempo de menina na roça não guardo uma só fotografia. Só tenho na memória as Páscoas mais verdadeiras que vivi.

5 respostas para “Aquelas santas sextas, por Valéria Figueira”

  • Que maravilha ver esse depoimento da grande amiga Valéria Figueira, que toca o coração das pessoas que valorizam a memória afetiva. Parabéns para Valéria e também para Pedro Massinha!

  • Lidice says:

    Que texto bonito Massa.. almoçamos hoje em família.. e recordei a menina de mãos dadas com as mulheres da casa( e tínhamos muitas.. mãe tias primas irmãs.. descíamos a rua dos Andrades, as empregadas e patroas com caldeirões de comida para dar aos presos( funcionava a delegacia , na sede da prefeitura… eu e as crianças curiosas e com medo, mas, aprendendo com o avô que, semana santa tinha que rezar, e compartilhar com os outros , do almoço sagrado desta sexta-feira santa, pq Jesus pagou por Tds nós)…, lá na casa de vovô, não havia risos, só música clássica e Tds falavam baixinho..da saudades só de lembrar de tantas sextas santas que passamos Tds juntos com a família!Hoje, foi almoço em família como fazíamos sempre, mas , com gosto de saudades de tantos que não estão mais aqui! Bjs amigo

  • Simone Dourado says:

    As lembranças de infância que nos trazem a simplicidade da vida e o seu real sentido.. Que delícia, que tempo bom…

  • Ana Palmira B.S. Casimiro says:

    Valéria retratou muito bem a vida na roça, as crenças e os costumes do seu tempo de menina.

    Parabéns!

  • Socorro Lopes says:

    Valéria Figueira, sou fã!
    Memórias…

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alessandro tibo


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