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Por Alexandre Xandó*

Na noite de ontem fomos surpreendidos com a notícia de mais um óbito nas dependências do Conjunto Penal de Vitória da Conquista. Até agora não temos maiores informações sobre a causa da morte, mas por macabra coincidência, o sétimo óbito na unidade, aconteceu na exata data que se completaram dois anos de inauguração do CPVC. Esta unidade de segurança máxima funciona no modelo de cogestão, no qual uma empresa administra a penitenciária com recursos repassados pelo Governo do Estado.

Chama a atenção a grande quantidade de mortes em tão pouco tempo, mas, além disso, o CPVC já foi alvo de diversas denuncias pelos órgãos que atuam na Execução Penal. Maus tratos, problemas com alimentação, dificuldade de acesso dos advogados aos seus clientes, e tantas outras situações são relatadas cotidianamente. Atualmente a unidade está em estado de superlotação. Para se ter ideia, diversas celas que possuem apenas 8 camas estão albergando 16 internos – que fazem revezamento para dormir.

Mesmo sendo um prédio novo, as condições são de insalubridade, e a quantidade de presos com graves problemas de saúde é alarmante. Este problema atinge não somente aos presos, mas também aos agentes de segurança que ali trabalham. As condições de trabalho são precárias, e o salário que recebem não é compatível com o labor que exercem, chegando a aproximadamente R$1.100,00 (mil e cem reais) após os descontos. Não há uma capacitação e qualificação contínua destes agentes, que recebem um treinamento relâmpago para trabalhar em um ambiente extremamente complexo e perigoso.

Esta política de terceirização/privatização dos presídios, que tem sido impulsionada pelo Governo do Estado, tem demonstrado na prática que não produz resultados positivos à sociedade. Neste ninho de indicações políticas, os casos de corrupção são comuns, e já tivemos agentes de segurança sendo presos por tentarem ingressar com drogas na unidade, e mais recentemente, um agente que falsificou um alvará de soltura de um preso.

Essa bomba relógio, pela qual já passaram três diretores em dois anos, pode explodir a qualquer momento, reproduzindo tragédias como a do Presídio de Pedrinhas no Maranhão. Mas a problemática do cárcere não se resume ao CPVC. O Presídio Nilton Gonçalves hoje abriga presos masculinos do regime semi-aberto e mulheres dos diversos regimes numa estrutura extremamente deteriorada.

Identificamos que o maior problema do Nilton Gonçalves hoje seja a situação das mulheres, onde internas dos regimes semiaberto, fechado e presas provisórias dividem o mesmo módulo, desrespeitando as previsões da Lei de Execução Penal. Recentemente este assunto foi tema de uma audiência pública na Câmara de Vereadores de Conquista e as opiniões são uníssonas: Precisamos de uma unidade feminina em nossa cidade! Temos ainda um alto índice de crimes cometidos por adolescentes, ao tempo em que não existe uma unidade de privação de liberdade, o que resulta em impunidade e na não aplicação de medidas socioeducativas a estes jovens. O projeto “Na Varanda” vem sendo sucateado dia-após-dia, e não há luz no fim do túnel.

Além disso, precisamos entender em que situação o Poder Judiciário se encontra. Sendo a única cidade do interior da Bahia com dois presídios, que abriga mais de 1.200 presos, temos uma Vara de Execução Penal funcionando em conjunto com a Vara do Júri. Traduzindo: apenas um Juiz e quatro servidores tem que dar conta de processar e julgar mais de quatro mil processos, nesta que é a 4ª cidade mais violenta da Bahia. Ocorre que o Art. 132 da Lei de Organização Judiciária do Estado da Bahia prevê expressamente que a nossa cidade deve ter 1 Juiz para a Vara de Execuções e 1 Juiz para a Vara do Júri.

Face a esta realidade, precisamos promover um esforço conjunto entre juristas, autoridades, universidades e entidades da sociedade civil, encarando com seriedade a questão carcerária em nossa cidade. De imediato é preciso que o Governo do Estado e o TJ-BA determinem o desmembramento das duas Varas, designando um Juiz específico para trabalhar com Execução Penal. Este Juiz, além de julgar com celeridade os processos, poderá realizar realizar inspeções com maior frequência e buscar parcerias e projetos que humanizem o cárcere e produzam oportunidades aos detentos. Ademais, precisamos entender que problemas complexos exigem medidas articuladas e planejamento de longo prazo, na tentativa de realizar, de fato, a ressocialização dos apenados. Enquanto isso não acontecer, as cadeias continuarão sendo fábricas de delinquentes e máquinas de moer gente – preta!

Alexandre Xandó é Professor de Direito Penal da UNEB – Campus Brumado,

Vice-Presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB,

 Membro do Conselho da Comunidade para Assuntos Penais